Partindo do pressuposto que a principal ferramenta de trabalho do terapeuta é a sua própria pessoa1 trago fragmentos de experiências clínicas que me ajudaram a estabelecer vias de comunicação e diálogos com adolescentes. Descrevo o quanto aprendi nesses diálogos e o quanto me fizeram pensar sobre meu lugar de terapeuta; sobre minhas crenças e responsabilidades. O primeiro fragmento diz respeito a uma sessão de terapia familiar com uma mãe e seu filho de 14 anos. O fato de o menino ter a idade e o nome do meu filho e de adotar uma postura semelhante à dele fez-me tomar a atitude de “pai bravo dando ordens para o filho se comportar direito na sala”. O garoto, como havia feito nas sessões anteriores, entra na sessão e se deita na cadeira e inclina a cabeça como se estivesse com sono. Reagindo a essa atitude, o mando ir ao banheiro e lavar o rosto e só voltar quando se sentisse acordado. Pensando na proposta de articulação entre a clinica com o conceito de “jogos de linguagem de Wittgenstein proposta por Araújo e Morgado2 pude ver o quanto aceitei o papel de ser o pai do garoto e o quanto este caso me ajudou a estar atento na relação com um adolescente em outro caso de atendimento familiar que fiz logo em seguida.Trata-se de uma sessão individual com garoto de 13 anos que inicia a sessão de uma maneira bastante semelhante ao do atendimento anterior relatado. O garoto não falando, deitou-se no sofá, dizendo que estava cansado. A mesma situação terapêutica se apresentava. Com o que tinha aprendido no caso anterior pude cuidar dos meus incômodos e trabalhar minha curiosidade3. Ao saber de seus momentos de solidão em casa, perguntei se ele tinha algum animal de estimação. Surpreendi-me ao saber que o animal que ele tinha era um “furão”; um animal que, como ele me disse, parecia com “uma pequena raposa, mas com uma cara de rato”. Ao perguntar mais sobre este animal fui criando uma ponte de comunicação com o garoto que me levou ao computador que havia no consultório para que ele pudesse pela internet me apresentar fotos desse animal. Depois de saciar a minha curiosidade e percebendo o menino mais a vontade na sessão pedi-lhe que trouxesse o furão na próxima vez que viesse o que foi imediatamente aceito por ele. A vinda do animal, correndo em círculos dentro do consultório, criou um ambiente de segurança e confiança4 proporcionando um momento lúdico com brincadeiras e boas risadas. O clima ajudou a consolidar a ponte entre o rapaz e eu, de tal forma que ele pode se sentir confiante e começar a falar sobre suas emoções e seus pedidos para os pais. Penso que estes relatos contribuem para a reflexão sobre os diferentes e inusitados recursos ao se lidar com universos tão diferentes de interpretações e envolvimentos. 1 COLOMBO, S. F. Em busca do Sagrado – In: Papai, mamãe, você e eu? Conversações terapêuticas em Famílias com Crianças..2 ARAUJO, N.B.; MORGADO, N. A escuta terapêutica na interlocução clínica: uma contribuição ao construcionismo social pelo viés do pragmatismo lingüístico. In: NPS,26 3ANDERSON, H. Terapia colaborativa: relacionamentos e conversações. In: NPS,33 e 4 WILSON, J. Engajando crianças e jovens,NPS32